sexta-feira, 27 de janeiro de 2012

Livre-arbítrio

Livre-arbítrio
Michelle Valle 

Aquilo que foi plantando em mim
A partir de seu olhar
Veio a fenecer hoje
Quando o sol começou a brilhar
Pela luz que lhe queimou toda a carne

E o que sobrou de mim
Foram alguns versos confusos
Palavras difusas
Frases que você não iria querer saber

Em meio ao desencontro do mundo
A contemplação da discórdia
O desatino das bombas que explodem
Começo a ver por um instante
Aquilo que dormiu sempre comigo no escuro

No meio de tantas coisas
Apenas um detalhe foi poupado
Deixei todas as vontades caladas
Enxuguei meus olhos
E permaneci no meu destino

Então se apegue ao que lhe der mais paz de espírito
Aquilo que lhe alimentar plenamente
Se jogue, mas use sabiamente o livre-arbítrio.
Não se sabe quem poderá vir para te julgar
Despeça-se dos castigos
Faça uma canção que fale de liberdade e dos seus amigos
Eu irei lhe escutar

Aos poucos os temores vão passando
Os dias vão clareando
Os sangramentos seguem se estancando
E as lágrimas, bom, essas aos poucos vão secando
E você vai ver que tudo não passou de uma fase...
Portanto, não viva na inércia esperando seu futuro,
Viva o presente e trabalhe
Pois o futuro, bom, esse poderá chegar muito tarde...

terça-feira, 24 de janeiro de 2012

Apenas mais uma história de amor

Apenas mais uma história de amor
Michelle Valle 

Eis um italianão bem resolvido
Moço em espírito
Mas bem vivido
Pleno de sabedoria

Encontra numa menina
A fonte da juventude
As respostas para suas perguntas
E a lua para iluminar a sua noite
Ele se perde nela
E ela se entrega para ele

Dois dias depois
Nada é mais como foi um dia
Os olhos brilham juntos
Quando os dois se olham
Eles vivem no mesmo mundo
E neste
Não habita mais ninguém

Ela apenas quer repousar sobre o corpo dele
Ele apenas quer assisti-la dormir
Ela quer apenas poder olhar sempre para ele
Ele quer prendê-la para sempre ali

E pode ser que o tempo passe
Que o amor esfrie
Que o relacionamento desgaste
Que nada mais se explique

Mas eles sempre serão...
É apenas mais uma história de amor
Dessas que dão certo
Só por terem começado
Independentemente de haver prazo de validade ou não
Só não é perecível o coração

Ela apenas quer repousar sobre o corpo dele
Ele apenas quer assisti-la dormir
Ela quer apenas poder olhar sempre para ele
Ele quer prendê-la para sempre ali


Páginas

Páginas
Michelle Valle

Então,
O mais valioso para mim agora
Seria abrir mão do tesouro
E deixa-lo ir embora
Não vejo mais riqueza no ouro
Não vejo mais tristeza no seu corpo
É apenas mais uma veia que me alimenta

Qualquer coisa que me desatinasse
Seria melhor
Mas sinceramente
Eu não me importo mais
Não quero mais um sentimento que me humilhe
Que me traga e me leve
Que me instigue
E depois me quebre
Eu realmente não preciso disso

Entre outras coisas
Há uma extensa lista
De razões
De rupturas
Desconexões
E fraquezas
Que eu queria te mostrar
Mas agora já não adianta
Eu já coloquei o dedo na garganta
Coloquei pra fora
Tudo aquilo que morava dentro de mim
Agora você não me faz mais mal
Talvez eu aprenda a ser livre
E também a ser menos passional



domingo, 22 de janeiro de 2012

Salgueiro-chorão

Salgueiro-chorão 
Michelle Valle

Hoje é o dia da loucura
Para alguém que tem a alma
Tão suave como eu
Eu que sou tão pura
Estou mergulhando
Naquilo que o mundo me deu

Isso me invade
Me cobre
Ficará em mim até mais tarde
Mas nem a morte me comove

As teias de aranha do teto
Dão nó na minha garganta
Então porque esse nó
Não arranca
Meu espírito por ali?

Vejo minha placidez sumir
Meu ouvido começa a zumbir
Então me pergunto e daí?
Nem a maior das confissões
Irá me redimir

Eu sou a boca do sarampo
Eu sou a moléstia que mora no canto
De uma casa suja do subúrbio
Querendo mascarar o meu distúrbio

Essa disfunção causada por excesso de mimo
Por ter corpo de sapo e me portar como um girino
E assim eu chego ao meu ponto ínfimo
E encontro meu amigo íntimo

Meu ego riscado
Ulcerado
Mal apreciado
Pobre coitado

Sou o rabo entre as pernas do gigante
Querendo chegar na frente
Mas com medo de ir adiante
Com fobia de gente

Mas toda loucura expelida
Termina com a caretice da vida
No dia-a-dia pobre
De quem quer bancar a nobre


sábado, 21 de janeiro de 2012

A virginiana

A virginiana
Michelle Valle

Eu venero minha insônia
Eu venero meus gemidos
Venero a peste bubônica
E os meus cinco sentidos

Eu compro minha paz
Eu alugo minha felicidade
O prazer contínuo não me satisfaz
Sou dependente da animosidade

Não bato em portas
Eu pulo degraus
Não uso botas
O salto delas me faz mal

Eu corro para os cantos
Eu fumo tabaco
Descasco paredes
Incendeio os matos

Eu arranho minhas pernas
Eu me jogo n’água
Me apaixono por pedras
Economizo mágoas

Eu durmo pelo dia
Mas continuo acordada
Faço do meu corredor uma via
A minha cama é imaculada

Dou nós no meu carinho
Aponto minha tristeza com uma faca
Enveneno os espinhos
Meu tapete é uma maca

Eu vejo fantasmas
Eu vejo elefantes
Meu perfume exala miasma
Meus livros dançam na estante

E eu
Quem sou eu agora?
Será que estou bem?
Quando será que irei embora?

Da altura dos meus sonhos

Da altura dos meus sonhos
Michelle Valle 

Dentro de mim
Há o esquecido
Há o inquieto
Há o destemido

São muitos os labirintos
Que me fazem me perder
Ouço minhas vozes pedindo ajuda
Mas nunca sei o que fazer

Serei sempre eu comigo
Tentando a sorte
Lutando contra os inimigos
A vida
A morte
Os silêncios
Os ruídos
As cicatrizes
E os cortes

Estarei mais uma vez tentando
Mas eu já nem lembro mais
Tentando o que
Permaneço esquecendo
Permaneço lembrando
Mas quem
E por quê?

De hoje em diante
Não deixarei
O ilusório me invadir
Bater em minha porta
Fazer amor comigo e partir
Não vou mais me deixar
Não vou mais me trair
Só há uma pessoa em quem posso confiar
E é em mim
Eu sou o meu lar

Da altura dos meus sonhos
Despencou uma criança
Ela estava atenta
Estava assustada
Ela tinha muita sede
Ela tinha muita fome
Ela queria correr o mundo
Ela queria se esconder nos matos
Tudo para ela tinha gosto de gesso
Ela precisava se arriscar
Buscar novos endereços
Ela tinha uma meta
Tinha algo para buscar
De tão solta
A criança
Não suportou a solidão interior
E se trancafiou
Virou prisioneira dela mesma
No calabouço que construiu
Para se distanciar
Do excesso de pessoas
Do excesso de palavras
Ela queria encontrar dentro de si
A resposta para o seu abismo interno
Ela queria viver o avesso
Do seu inferno
Ela precisava fluir
Ela precisava ser
Ela precisava subir
Pra depois descer
E a criança
Foi começando a crescer
A observar os outros
Passou a aprender
Viu que com erros
Se pode ter sabedoria e consciência
E que ela não precisava mais se submeter
Foi virando mocinha
Foi virando mulher
Foi deixando de ficar sozinha
Começou a ver a si mesma
Em um ser qualquer
Hoje nada mais a limita
Nada mais a impede de ficar de pé
Secaram-se, então as lágrimas da criança aflita
Ela está livre
Para ir onde quiser
Ela vê beleza em belos olhos
Pois ela já sabe que para crer precisa-se de fé
Ela vive dentro de mim
Eu sou quem ela é


quarta-feira, 18 de janeiro de 2012

Fêmeas

Fêmeas
Michelle Valle

Na sedução
Que nos prendia
E nos mantinha imóveis
O trabalho das mãos
Dos corpos
Dos cinco sentidos
A carne e a libido
Éramos infiéis

Como as imperatrizes do mundo
Com a chave de todo o prazer na boca
Éramos o elo profundo
Éramos uma a metade da outra
Éramos tudo
Éramos loucas

Debruçadas sobre a nudez
Sobre o canto magistral
Esboçando a rudez
No nosso ritual
Éramos os quatro elementos
A terra, o fogo, a água e o vento
Éramos o bem e o mal

Nos conhecíamos por dentro
Procurávamos nossos recheios
Invadindo nossa razão
Nos partíamos ao meio
Mas nunca esquecíamos do coração

Nos líamos
Nos interpretávamos
Nós misturávamos
E eventualmente nos separávamos

Mas permanecíamos aglutinadas
Imóveis
Distantes da censura
Absolutamente extasiadas

Tínhamos a beleza do mundo
Éramos rodeadas pela dor
Sabíamos fazer de tudo
Mas nunca ousamos falar de amor

quinta-feira, 12 de janeiro de 2012

Elefante Branco

Elefante branco
Michelle Valle

Eu moro na rua dos pudores
Na avenida da hipocrisia bruta
Camuflada por flores
Que escondem as putas

Eu moro na esquina das dores
No bairro da cólera
Mascarada pelos amores
Aonde a miséria faz cócegas

Eu moro no beco das angústias
No marasmo de um câncer
Onde acontecem as permutas
Dos vendedores dos derivados do pó mágico dos Andes

Eu moro na cidade da pobreza
No quarteirão do desassossego
Lado a lado ao da tristeza
A maior vizinha do medo

Eu moro na vila do cansaço
Do impiedoso tédio
Aonde eu aperto mais meu laço
Quando falta meu remédio

Eu moro no lugar mais perigoso do mundo
Moro dentro de mim
No meu ego imundo
Que me faz ficar aqui

Vomitando essas verdades
Em pleno dia de sábado
Levando as idéias até mais tarde
Sem nenhum eufemismo prático

Longe Demais

Longe demais
Michelle Valle

Leve esse teu tanto
Pois já me sobra
Eu lhe garanto
Na minha voz
Na entonação do meu canto
Eu já não quero mais

Foi de sufocar
De tapar a garganta
Para não gritar
Eu duvidei
Mas não consegui ignorar

Ceguei minha boca
Calei meus ouvidos
Fiz-me de louca
Alterei meus sentidos
Mas não pude mais aguentar

Anulei meu bem maior
Para lhe ser
Um amor só
Fiel e leal

Mostrei-te a minha nudez
Fiz uma fogueira na minha frigidez
Lhe dei o meu todo
E logo na minha vez
Você não pode me dar mais
Do que eu queria
E agora eu sei
Eu fui longe demais

Pedindo Perdão

Pedindo Perdão
Michelle Valle


Perdoe-me
Se não pude ver
As diferentes cores
Que me mostra a vida
Na sua explicação
Sobre os amores
Perdoe-me
Se não pude ser evoluída
A ponto de viver a vida
Sem ignorar as dores
A culpa é minha
Por ter sido submissa
A sedução das flores
Perdoe-me por me permitir ser invadida
Pelos formatos e pelos calores
De corpos que enganavam meus olhos
E exalavam seus odores
Perdoe-me pela ingenuidade
E ao mesmo tempo
Pela minha malícia
Não sei viver de momentos
Apenas confundo tapas com carícias
Perdoe-me pela indulgência
Pela fraqueza nos olhos
Pela minha falta de certezas
Perdoe-me pela covardia
Pela vontade de me jogar
Nas minhas paixões
Mas me prender na solidão que me mostram os dias
Perdoe-me pela rebeldia
Essa minha necessidade de mudar e contestar
O que é fato
E a escolha não é minha
Perdoe-me pelas lágrimas
Pelos dias desperdiçados
Pelas horas mal vividas
Pelas noites em claro
Perdoe-me pelas desistências
Pelo medo de correr riscos
Pela minha excessiva carência
Perdoe-me pelas fugas
Por aqueles momentos em que recorri às sombras
E passava a maior parte do meu tempo pelas ruas
Perdoe-me pelas coisas impuras
Pelo meu envelhecimento precoce
Pelas minhas notáveis rugas
Perdoe-me por ter deixado o Céu
Perdoe-me por ser eu